quarta-feira, 18 de março de 2015

HOMENS-FORMIGA

Calhou ontem deter-me diante de uma reportagem televisiva acerca de dois homens que vivem debaixo da ponte, debaixo dos carros, frente ao mar de Oeiras. Dois homens na "casa" dos 40 e 50 anos creio, para quem uma casa quentinha, uma cama confortável e um banho quente ou uma bebida fresca são sonho.
Voltas e mais voltas, não é nisso em que me centro. Dignidade é um sentir que felizmente deles continua a fazer parte. A noite para eles pesa, e é quando partem pelas ruas à procura de peças de metal para poder vender e fazer alguns trocados.

Continuo a vê-los, parecem-me menos, mas continuo a ver as mantas embrulhadas em cartões, debaixo de algum alpendre ou junto a um caixote. À noite, em certos pontos da cidade, há distribuição de comida.

Não muito distante, há aquela curva, ao meio da subida, onde uma casa meio de lata alberga diversos desses homens-formiga que revira tudo o que é lixo para poder vender. Os colchões são esventrados, bem como grandes e pequenos electrodomésticos, restos de carrinhos de bebé, brinquedos ou bugigangas.
Tudo é reciclado. Não no sentido utilitário primeiro, porque é mais fácil despejar do que dirigir a quem precisa, mas ainda assim é feita uma espécie de justiça poética. Nada dura na rua por muito tempo. A ver quem chega primeiro.
E muitas das vezes em que por lá passo, na curva onde pelo postigo se divertiram um dia a assustar-nos e eu os repreendi, me lembro de uma outra vez em que nos disseram: "Tu estuda, para não vires a ser como eu!".



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